Para completar o PowerPoint sobre o poema "Autopsicografia", de Fernando Pessoa, aqui fica uma breve análise ao texto:
AUTOPSICOGRAFIA
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente
E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração
O poema
"Autopsicografia", escrito em 1930 e publicado em 1932, é porventura
um dos poemas mais conhecidos de Fernando Pessoa.
Autopsicografia pode ser traduzido como "escrita da própria alma". De certa maneira é Pessoa aqui o espírito que transmite
a mensagem ao Fernando Pessoa que escreve.
Porquê este título? Porque nos
parece que Pessoa quer descobrir para si mesmo o mistério da sua poesia e
sobretudo da arte de ser poeta. Quem é o poeta, e porque será que o poeta
escreve? A resposta, enrolada num mistério, apenas poderá ser desvendada
através de um método igualmente misterioso.
Analisemos então o poema estrofe a estrofe:
O poeta é um fingidor/Finge tão
completamente/Que chega a fingir que é dor/A dor que deveras sente
É certo que este poema desvenda
de certo modo a "teoria poética" Pessoana, mas não nos iludamos com a
presença de certezas. Pessoa define o poeta como um "fingidor", mas
fala apenas de si mesmo. Novamente reforçamos a importância da análise do
título: é Pessoa a falar de si a si mesmo. Um poeta pode não ser um fingidor,
mas ele, enquanto poeta, é revelado enquanto um fingidor.
Uma ponta dessa revelação é que
o fingimento serve para mascarar a dor. A dor que Pessoa sente é real. Mas
através da poesia, a dor que ele
sente, finge-a, ao ponto de a dor real parecer fingida. Mas ela é real? No
início, sim, mas depois do filtro da poesia, já nada é real, mas sim emocionado
ou raciocinado.
E os que leem o que escreve,/Na
dor lida sentem bem,/Não as duas que ele teve,/Mas só a que eles não têm.
Se o poeta já não consegue
distinguir o que sente, resta essa missão a quem o lê, a quem lê a intelectualização que ele
produz.
Mas engane-se quem pensa poder
identificar-se com a dor que o poeta sente. Pessoa diz, e muito bem, que quem
lê sente apenas a ausência da dor em si mesmo e não a dor presente no poeta. O
poeta tem as "duas dores", a real e a fingida, mas quem lê não tem
nenhuma das duas - apenas a ausência de dor em si mesmos.
A sublimação da dor em poesia
não pode ser sentida por quem lê. Isto é compreensível, visto que é quem
escreve que sente intimamente a dor que o leva a escrever. É essa ausência a
única coisa a ser verdadeiramente sentida por que lê. Quanto muito quem lê
tenta ver a origem da dor de quem escreve - mas à distância.
E assim nas calhas de roda/Gira, a entreter a razão,/Esse comboio de corda/Que se chama coração
Esta perda de sentido da
dor - que ilude quem a sente, sobretudo se é um poeta, leva a Pessoa chamar
pelo seu coração. O coração aqui é claramente equiparado tanto à dor como à
emoção: é o coração que sente, é o coração que "entretém a razão".
Será um desabafo solene de Pessoa, visto que a sua dor é emocional e não acha
uma resolução racional definitiva para a mesma? É possível, mas apetece-nos no
final desta análise dizer: decida quem lê.
NOTA:
- para imprimires este texto que acabaste de ler, carrega aqui.
- para completares o teu estudo com uma análise aos aspetos sintáticos e semânticos deste poema, imprime e lê com muita atenção este documento.
BOM ESTUDO!
BOM ESTUDO!
Muito boa a análise! Parabéns e obrigado por esta.
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